Manoel
Belarmino*
Eu já
ouvi dizer que "quem controla as sementes, controla a vida". E esse
dizer continua cada vez mais sendo verdadeiro. Nos tempos atuais, cada vez
mais, os pequenos agricultores, camponeses das comunidades tradicionais, vêm
perdendo as sementes e a soberania alimentar. Os agricultores perderam as
sementes; e quase tudo que consomem vem do mercado.
A
agricultura familiar e camponesa cada vez mais caminha para a sua diversidade
de culturas reduzida ou para a monocultura. O modelo agrícola atual forçou os
caponeses tradicionais a imitarem o agronegócio monocultor.
Onde se
plantava fava, feijão de corda, feijão, guandu, batata, melancia, melão,
jerimum, abóbora, milho, cana d'angola, pepino, mandioca, aipim, algodão, neste
sertão, avista-se campos em processo de desertificação com capim buffell e
algumas poucas palmas forrageiras. Ou alguns poucos pés de milho para a
forragem das vacas de leite. E mais nada.
Nos lugares
que se criava galinha caipira, capão, guiné, porco, ovelha, cabra e vaca pé
dura adaptada à caatinga, só vaca de leite mesmo. Embora sabemos, e devemos
incentivar e fortalecer a produção de leite. Esta gera trabalho e renda. Mas
não é só a cultura do leite que gera renda na agricultura ou na pecuária. Há
outras culturas que deveriam ser recuperadas e incentivadas.
O sertão
tem terras desmatadas a perder de vista. Quando a estiagem chega parece um
deserto vermelho. O buffell desaparece e fica literalmente sumido por mais de 7
meses. Só o chão vermelho. O agricultor familiar não consegue mais plantar
aquela diversidade de culturas. Não tem mais aquelas sementes tradicionais
adaptadas à terras semiáridas. Perdeu tudo. Agora só sementes híbridas ou
transgênicas no mercado que custam "os olhos da cara".
Criar
animais, tipo miuça adaptada à caatinga, nem pensar. Não há mais caatinga para
a criação de cabra e boi orgânico na caatinga. Tudo foi arrancado pelo toco
para dar lugar ao buffell e às malditas algarobas exóticas. No lugar da rica
jurema preta está a algaroba. No lugar das ramas da caatinga está o buffell. E,
no verão, a terra se compacta, sob o Sol quente e as enxurradas, em processo
acelerado de desertificação.
É
urgente, e até uma questão humanitária, as providências dos governos
municipais, por estarem mais próximos do povo e das comunidades locais, que
construam políticas públicas de agricultura com foco na recuperação e na
preservação das sementes tradicionais que ainda existem. É urgente a construção
de bancos de sementes com estruturas básicas de produção, armazenamento e
compartilhamento das sementes nas comunidades tradicionais da pequena
agricultura.
As
tecnologias adaptadas ao semiárido estão aí. Recuperar as sementes crioulas, as
tradicionais, custa pouco. Recuperar o modelo da produção diversificada de
alimentos custa pouco, basta implementar as tecnologias adequadas à região,
ouvir os mais velhos e ter vontade política e vontade técnica.
Eu
acredito que é possivel, ainda, recuperar os valores da agricultura tradicional
que produz comida, gera renda e trabalho e sustenta a soberania alimentar nas
comunidades.
Lembro-me,
e não faz muito tempo, que no Assentamento Cajueiro foi construído com dinheiro
público um Banco de Sementes com estruturas de produção e armazenamento. Não
foi produzida a primeira semente e não se armazenou o primeiro lote de
sementes. Nunca funcionou. O Poder Público Municipal, sem compromisso com a
produção de comida, não deu assistência técnica e abandonou as estruturas.
Um
governo Federal, Estadual ou Municipal, que não tiver compromisso com a
produção ou com o acesso à comida, não tem compromisso com a vida.
Nessas
eleições de 2024, em Poço Redondo, município que tem um potencial agrícola
extraordinário, espero que seja construído um bom projeto de governo municipal
e que seja registrado como compromisso com o povo na Justiça Eleitoral quando
no registro das candidaturas de prefeito. Planos de governo troncho,
descontextualizados e tecnicamente impossíveis de serem implantados ou aqueles
vazios, pobres de propostas viáveis, viram verdadeiros documentos de
"estelionato eleitoral". A luta não é só pelo voto. Esta só acontece
em tempos de eleições. A verdadeira luta é pela geração de trabalho e renda no
campo e na cidade e pela produção e acesso à comida. A luta é pelas políticas
públicas essenciais.
Uma verdade:
"quem controla as sementes, controla a vida".
*Manoel
Belarmino dos Santos – escritor, poeta, cordelista, formando em jornalismo pela
Universidade Estácio – Registro Profissional (DRT): 0002678/SE.
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