A LIÇÃO DA CABEÇA DE FRADE


Manoel Belarmino

No último sábado, dia 15, estive no Maranduba e no Sitio dos Soares, em Poço Redondo, em busca dos cristais de quartzo e pude pisar sobre os torrões da antiga casa dos meus avós, onde eu nasci. E mesmo com o desmatamento daquela caatinga que abrigou por séculos os povos caatingueiros, ainda pude ver as cabeças de frades (melocactus zehnteri), cactos exemplos de resistência.

Nós, os caatingueiros, precisamos aprender a conviver com o semiárido, aproveitando os ensinamentos das plantas. No Semiárido Brasileiro, com quase 900.000 km², em grande parte do ano não chove, por isso o solo é seco e esturricado. Quando chove, nos períodos das trovoadas e do inverno, muitas vezes as chuvas são torrenciais e caem de forma rápida, e a terra só molha a superfície, o suficiente para garantir a molhação das plantas que coletam água. As plantas que mais coletam água das chuvas são os cactos. E dentre elas a coroa de frade (melocactus zehnteri). Este cacto mantém sua estrutura fixa ao solo por raízes profundas, mas mantém a maior parte das raízes espalhadas pela superfície do solo, até mesmo sobre a terra, coberta por folhas secas ou embaixo de pedras ou madeira em decomposição, onde consegue em pouco tempo captar a água no curto período de molhação das chuvas.
 
A coroa de frade consegue, rapidamente, coletar a água da chuva antes que o solo seque com a evaporação, sem previsão de quando as chuvas retornarão. As cabeças de frade resistem vivas, usando sua água armazenada em "seu corpo", uma estiagem longa de aproximadamente 18 meses.

Enquanto outras plantas sofrem com a escassez de água, perdem as folhas e ficam esbranquiçadas na estiagem, a cabeça de frade permanece verde. Isso acontece por causa das estruturas radiculares, que em uma planta adulta chega a ter um metro de comprimento para todas as direções, coletando assim a água de uma área de cerca de 2 m². A planta desenvolveu essa sua capacidade de adaptação no semiárido, no decorrer de sua evolução. A cabeça de grade é um dos seres vivos mais apropriados a viver em condições adversas. Encontramos na caatinga a espécie até mesmo em rachaduras de pedras, caracterizando a coroa de frade, como um dos vegetais, mas resistentes e adaptados ao clima semiárido.

Na caatinga, o cacto chega a ser usado na alimentação animal e na produção de doces e sorvetes. Percebe-se, no entanto, que o uso dessa planta em larga escala, sem dúvidas, poderá ocorrer o risco de extinção da espécie. É necessário o replantio da cabeça de frade para a perpetuação do bioma caatinga.

A cabeça de frade (melocactus zehnteri), assim como o mandacaru (cereus jamacaru), o xique-xique (pilosocereus gounelle), o facheiro (pilosocereus pachycladus), a favela (cnidoscolus quercifolius) e o umbuzeiro (spondias tuberosa L.) e tantas outras plantas da caatinga são coletoras de água das chuvas. Devemos aprender a conviver no semiárido com as plantas. As plantas da caatinga nos ensinam grandes lições de como conviver na caatinga. Nós é que não aprendemos.

Nós precisamos aprender a escutar a voz da biodiversidade da caatinga.

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